domingo, 8 de agosto de 2010

CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DE LEIS MUNICIPAIS

• INTRODUÇÃO.

O presente trabalho tem como finalidade elucidar o leitor sobre a inconstitucionalidade das leis municipais e as formas de arguição perante o STF e o Tribunal de Justiça de São Paulo, esclarecendo, em síntese, o procedimento da Declaração de Inconstitucionalidade dentro do capítulo específico do Controle de Constitucionalidade, atividade típica das Constituições Rígidas como a Constituição da República de 1988.

• HERMENÊUTICA CONSTITUCIONAL.

Hermenêutica é o ramo da filosofia que estuda a interpretação de textos conferindo métodos e fixando limites à interpretação da Constituição. É com base nela que se afere o sentido da palavra do texto Constitucional para extrair todo seu conteúdo.

• MÉTODOS DE INTERPRETAÇÃO.

A hermenêutica constitucional é realizada através dos seguintes métodos:
Histórico: Análise das propostas, debates e reuniões para se identificar a intenção do legislador quando elaborou a lei.

Teleológico: Busca a finalidade da lei.

Literal: É a própria palavra em seu sentido expresso e direto.

Sistemática: Analisa-se a norma e o direito como um todo único.

Autêntica: Realizada pelo próprio órgão que emanou o ato normativo.

Havendo várias interpretações conflitantes, deve prevalecer a que garante a constitucionalidade da norma, ou seja, na dúvida a norma é constitucional.

• POSTULADOS CONSTITUCIONAIS.

Além dos métodos supracitados, a interpretação das normas infraconstitucionais deve respeitar os seguintes postulados constitucionais:

Supremacia da Constituição: A norma Constitucional é suprema, nenhuma outra norma positivada no ordenamento jurídico pode contrariá-la ou superá-la, sendo um dos destaques das Constituições Rígidas.

Unidade Constitucional: Os dispositivos da Constituição não podem entrar em conflitos, deve seu um todo único.

Máxima Efetividade: A aplicação da norma deve ser de tal maneira que se possa extrair todo seu conteúdo, trazendo pacificação social.

Harmonização: É o resultado da interpretação e aplicação da norma trazendo, no caso concreto, estabilidade e segurança aos indivíduos.

• INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO.

Havendo várias interpretações conflitantes de determinado dispositivo legal, poderá o Poder Judiciário fixar uma interpretação única, que valerá para aquela norma, fulminando de inconstitucionalidade as demais interpretações.

• DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE SEM REDUÇÃO DE TEXTO.

Em se tratando de inconstitucionalidade sem redução de texto, a declaração se limitará a decretar que certa interpretação dada ao ato normativo é inconstitucional, permanecendo constitucionais as demais interpretações, ou seja, a expressão literal do dispositivo afetado não sofre alteração.

• DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE COM REDUÇÃO DE TEXTO.

Nesse caso, a inconstitucionalidade não reside na interpretação, mas sim na palavra contida no texto normativo que deve ser reputada não escrita.

• INCONSTITUCIONALIDADE OU ILEGALIDADE.

A inconstitucionalidade é vício em que a norma impugnada contraria direta ou indiretamente a Constituição Federal ou Estadual.

A ilegalidade é vício em que a norma impugnada não possui ligação direta com a Constituição, falta o elo. Ex: Decreto municipal sem prévia lei.

• INCONSTITUCIONALIDADE POR AÇÃO:

Inconstitucionalidade Material: O conteúdo da norma contraria texto expresso da Constituição, ou seja, o direito material.

Inconstitucionalidade Formal: O vício está no processo legislativo.

Inconstitucionalidade Direta: A lei ou ato normativo afrontam diretamente a Constituição.

Inconstitucionalidade Reflexa ou Oblíqua: A afronta é à outra lei, que é constitucional, logo indiretamente se afronta a Constituição.

• SISTEMAS DE CONTROLE

Político: É exercido por órgão que não integra a estrutura do Poder Judiciário, no Brasil cabe aos Poderes, Legislativo através de suas comissões e Executivo através do veto.

É exercido de forma preventiva, dentro do processo legislativo, em esfera municipal compete à Câmara e ao Prefeito.

Judicial: É exercido de forma repressiva pelo Poder Judiciário através de controle de constitucionalidade abstrato/concentrado e difuso/concreto.

Controle Concentrado/Abstrato (Artigo 103 – CF): Realizado através de Ação Direta de Inconstitucionalidade, Ação Declaratória de Constitucionalidade e Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental perante o Supremo Tribunal Federal e através de Reclamação de Inconstitucionalidade nos Tribunais de Justiça (Artigo 125, §2º - CF).

São legitimados perante o STF os previstos no artigo 103 da Constituição Federal:

I - o Presidente da República;
II - a Mesa do Senado Federal;
III - a Mesa da Câmara dos Deputados;
IV - a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal;
IV - a Mesa de Assembléia Legislativa;
V - o Governador de Estado ou do Distrito Federal;
VI - o Procurador-Geral da República;
VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;
VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;
IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

Ação Direta de Inconstitucionalidade (Artigo 2º da Lei 9.868/99): Visa declarar a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo federal ou estadual.

Resultado: Se a decisão for procedente a norma é inconstitucional, se for improcedente será constitucional.

Ação Declaratória de Constitucionalidade (Artigo 13º da Lei 9.868/99): Incluída na Constituição Federal com a Emenda n.º 03 de 17/03/1993. Visa declarar a constitucionalidade de uma lei federal, necessita de prévia controvérsia judicial, pois a princípio, todas as normas são constitucionais.

Resultado: Se a decisão for procedente a norma é constitucional, se for improcedente será inconstitucional.

Efeitos: Tanto a ADIn quanto a ADCon, em regra, tem efeito erga omnes e ex tunc, ou seja, vale para todos e retroage a data da publicação da norma. Todavia, em caso de exceção o STF, em respeito à segurança jurídica, pode conceder efeito ex nunc ou determinar quando serão iniciados os efeitos da decisão.

Medida Cautelar: A lei n.º 9.868/99 em seu artigo 10, traz a possibilidade de Medida Cautelar em ADIn e em caso de excepcional urgência sem ouvir a autoridade que proferiu o ato impugnado, mas a regra é ouvi-la previamente.

Já em se tratando de ADCon a medida cautelar servirá para suspender todos os processo judiciais que tem como fundamento a norma impugnada (artigo 21 da lei 9868/99).

Controle Difuso/Concreto: É realizado no âmbito de Ação de Conhecimento, de forma incidental, dentro da causa de pedir da ação e nunca no pedido. Pode ser proposta em juízo de primeira instância e chegará ao STF através de Recurso Extraordinário, se a afronta for a Constituição Federal.

Efeitos: Possui efeito inter partes e ex tunc, ou seja, só vale para as partes que estejam litigando. Todavia, o TJ poderá informar a Câmara Municipal para que suspenda a eficácia da norma através de resolução.

• COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.

Recurso Extraordinário: Somente em caso de controle difuso que será cabível o Recurso Extraordinário ao STF, pois não é possível controle de constitucionalidade abstrato de lei municipal em face da Constituição Federal.

Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (Art. 102, §1º - CF e Lei n.º 9882/99). No presente estudo, é utilizada quando houver afronta de lei ou ato normativo municipal em face da Constituição Federal, pois não é cabível ADin de lei municipal no STF e a constitucionalidade das lei é preceito fundamental.

Nesse caso, são legitimados os mesmos para ADIn e ADCon perante o STF.

• COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA.

Reclamação de Inconstitucionalidade (Controle Abstrato – artigo 125, § 2º - CF): Em controle abstrato de constitucionalidade o Tribunal de Justiça será competente caso haja afronta à Constituição Estadual.

Legitimados: Em se tratando do Estado de São Paulo, a Constituição paulista trata no artigo 90 da inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e traz como legitimados a propor ação de inconstitucionalidade os seguintes:

I - o Governador do Estado e a Mesa da Assembléia Legislativa;
II - o Prefeito e a Mesa da Câmara Municipal;
III - o Procurador-Geral de Justiça;
IV - o Conselho da Seção Estadual da Ordem dos Advogados do Brasil;
V - as entidades sindicais ou de classe, de atuação estadual ou municipal, demonstrando seu interesse jurídico no caso;
VI - os partidos políticos com representação na Assembléia Legislativa, ou, em se tratando de lei ou ato normativo municipais, na respectiva Câmara.

Procedimento: O legitimado, impugnando a norma ou ato normativo requer a declaração de inconstitucionalidade no todo em parte da norma, apontando o dispositivo ou dispositivos inconstitucionais. Após receber a Petição, o TJ determina a citação do Procurador Geral do Estado que fará a defesa da norma impugnada em 15 dias. Após ouvirá o Procurador Geral de Justiça no prazo de 15 dias.

Declaração de Inconstitucionalidade Incidental (Difuso): Como esclarecido anteriormente o controle difuso se dá em causa de pedir de ação de conhecimento.

Procedimento: Em primeira instância o juiz singular decide. Chegando ao Tribunal através de recurso, a Câmara determinará a suspensão do julgamento do recurso e remeterá a questão da inconstitucionalidade ao Órgão Especial. Poderá, ainda, o TJ comunicar a decisão à Câmara Municipal para que suspenda a eficácia da norma impugnada (Artigo 90, § 3º - CE/SP).

Após a decisão, se constitucional ou não, a Câmara inicial julgará o recurso interposto, em decorrência do princípio da Reserva de Plenário.

Reserva de Plenário: Está tratado no artigo 97 da CF, artigo 90, § 5º da Constituição de São Paulo , Regimento Interno do TJSP , bem como na súmula vinculante n.º 10 , a qual determina que em todo tribunal o reconhecimento de inconstitucionalidade será realizado por maioria absoluta de seus membros ou órgão especial e não pela Câmara julgadora de recurso.

No caso do Estado de São Paulo que há Órgão Especial é necessária para a instalação da sessão a presença de 2/3 dos membros e para se declarar a inconstitucionalidade o voto da maioria absoluta.

Em caso de controle abstrato/concentrado de constitucionalidade não é admissível Assistência, porém a jurisprudência admite a figura do amicus curiae, pois o procedimento em âmbito estadual segue o rito da Lei 9868/99.

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